





Em 1995, Guilherme Fontes, o inesquecível Alexandre de "A Viagem", então no auge da fama como ator de novelas da Globo, resolveu se lançar como diretor de cinema com um projeto grandioso: transformar a biografia "Chatô, o Rei do Brasil", de Fernando Morais, em um longa-metragem. 3e3q4j
A ideia era ousada. O filme contaria a vida de Assis Chateaubriand, magnata das comunicações e figura polêmica da história brasileira. Com apoio da Lei Rouanet e da Lei do Audiovisual, Fontes conseguiu captar cerca de R$ 8,6 milhões em tempo recorde. Tudo indicava que ele estava prestes a repetir o sucesso que havia conquistado como galã da televisão, mas no comando das câmeras. Só que o sonho virou pesadelo.
"Chatô – O Rei do Brasil" deveria ter sido lançado em 1997. No entanto, a produção se arrastou por quase duas décadas. Enquanto tentava concluir o filme, Fontes mergulhou em uma batalha jurídica com a Ancine e o Tribunal de Contas da União, acusado de má gestão de recursos públicos. Foi condenado a devolver R$ 71 milhões, valor que, com juros e correções, ultraaria os R$ 80 milhões. Eita!
Ao longo dos anos, viu sua carreira de ator desacelerar, precisou vender bens para sustentar a produção e foi demonizado pela imprensa, que o tratava como símbolo de desperdício e irresponsabilidade. O projeto virou um estigma.
E é nesse cenário (com o filme finalmente prestes a estrear, em 2015, e com a cabeça cheia de mágoas) que ele soltou uma entrevista bombástica à revista Playboy. Entre as muitas críticas a políticos e colegas de profissão, uma frase ressoou com força especial: “O Gil foi omisso e covarde comigo".
Gilberto Gil foi Ministro da Cultura entre 2003 e 2008, no governo Lula. E segundo Guilherme Fontes, era uma peça-chave que poderia ter destravado parte do financiamento do filme naquele período. A decepção de Fontes era ainda mais profunda por conta de laços pessoais: "Ele me conhece desde criança", disse. Preta Gil, filha do músico, chegou a trabalhar no início da produção, segundo o próprio Fontes.
A expectativa era que Gil, à frente do MinC, ajudasse a encontrar soluções para concluir o longa. Mas isso nunca aconteceu. “Ele fez aquela cara de eio, de paisagem”, acusou. A gota d’água veio quando o ator, em visita ao ministério, ouviu de um assessor: “Esse projeto nunca poderia ter sido aprovado".
O cineasta respondeu de imediato: “Você conhece o projeto, já leu alguma frase dele? Fica quieto aí que você não sabe de nada". O episódio, segundo ele, selou seu destino:“Entrei para a lista 'negra' do Rangel [Manoel Rangel, então na Ancine]. E assim que ele assumiu, me proibiu de captar".
A frustração se acumulou em camadas. “O Gil não moveu uma palha, zero, estava sempre muito ocupado. Estava mais interessado em colocar a coroa de símbolo cultural do Brasil do que em entender a executividade do processo cultural", detonou. Guilherme deixou claro que esperava, no mínimo, uma tentativa de diálogo. O que recebeu foi silêncio institucional. E, para ele, isso bastava para classificar Gil como "omisso e covarde".
“As pessoas sujam as mãos no poder e não querem que os outros vejam que a mão está suja”, disparou.
"Chatô – O Rei do Brasil" estreou finalmente em novembro de 2015, exatos 20 anos após o início das filmagens. Apesar do esforço hercúleo, a produção dividiu opiniões e teve desempenho modesto nos cinemas. Mas para Fontes, o simples fato de lançá-lo já era uma vitória.


